
Dandan tem 14 anos e 4 meses de vida, e um problema sério e muito doloroso na coluna. Estávamos tratando com medicamentos e acupuntura, mas ele não está aguentando mais, e não conseguimos mais vê-lo sofrer, afinal também estamos sofrendo. E pensar que ele corria, pulava, subia, descia, cavava, mas que merda de vida!
Ele vai morrer amanhã.
Tudo junto, administrar a dor da perda e a dor da decisão da perda, é algo penoso e de muita responsabilidade, porque jamais saberemos se, com o tratamento, ele voltaria a ter boas condições de vida. Sei que é possível, mas não sei se no caso dele o é.
Quem precisa de um cachorro? pra sofrer mais? como se já não bastasse todas as dores que já sentimos até hoje, todas as perdas que já choramos até hoje; e, pior, as que ainda virão!
Nos acumulamos de tanta vida ao nosso redor e, depois, temos que fazer das tripas coração, para tentar dar conta da dor que tanta vida, infalivelmente, acarreta.
Li, há pouco tempo atrás, um livro narrado pela morte "A Menina que roubava livros", e ali, ela não se mostrava refratária à dor, pelo contrário, ela parecia sentir todo o peso de sua presença na vida dos que ficavam, mas sabia que alguém, algum dia, haveria de fazer seu sujo, insano e eterno trabalho. Levar daqui, da nossa companhia, entes queridos, e, daqui a pouco, levar a nós mesmos, dá o que falar, mas hoje estou tão arrasada com a atitude de decidir que é melhor abreviar a dor do dandan e saber que nunca mais o verei, que não tenho condições de ir além do lamentável e lancinante do fato.
Várias coisas passam pela minha cabeça, várias situações em que ele estava presente, me aparecem num flash: passeios, cochilos, carinhos, lambidas, corridas, e tb várias formas de lidar com o buraco que ficará. Não sei como meu irmão está, imagino que desolado, mas, além disso, estou pensando em como é confortável a vida de pessoas que, talvez para se protegerem justamente de situações como esta, não cultivam nem uma planta. Vivem sem a dor, a mortificante dor de chorar a perda de alguém, mas também vivem sem a experiência de anos e anos de convivência, de risos, de abraços, de porradaria, de mau-humor, de cuidado, de resfriado, de praia, de porre, de tombo, enfim, de uma vida sendo contada não só por você, mas por outras pessoas a sua volta, com outras formas de encarar a vida, os tombos, os porres, os abraços.
Talvez, escrevendo aqui, seja uma maneira de dizer ao dandan como o amo, embora já o tenha dito inúmeras vezes.
Uma homenagem ao parceiro de tantos momentos bacanas juntos. Nunca vou me esquecer da fissura que ele ficava quando via o mar, hehe, ninguém conseguia segura-lo. E quando ele espantou dois suspeitos que entraram no condomínio que a minha mãe morava? Nossa, ali ele se tornou o herói e não tinha um vizinho que não viesse passar a mão nele com gratidão, não por ele ser bravo, longe disso, mas por ser brincalhão, estabanado e, muito provavelmente, ter confundido um dos suspeitos com o meu pai - pelo menos, era o que a minha mãe dizia.
Bom, é isso, sem grandes elocubrações, porque tô frágil, tô fraca, quase sem disposição para pensar, quero deixar aqui o meu protesto contra a maldita morte, ou seja lá o que isso for! e quero deixar registrada a minha homenagem/saudade ao dandan, que foi o único cachorro que tive, que adorava ir ao veterinário. O Mário mesmo dizia, "cara, o dandan é tão feliz, tão brincalhão que é o único cachorro que gosta de vir me ver!"
Amanhã eles vão se ver pela última vez.
Dandan, eu te amo muito, vc sempre foi muito doce, estabanado, ciumento, bobão e obediente. Adorei ter te conhecido e convivido com você, por isso, se houver a mais remota possibilidade, saiba que, por mim, a gente se encontra na próxima de novo.
AP