sexta-feira, 4 de setembro de 2009

“…VAI PASSAR…”


Tem sido cada vez mais comum encontrarmos textos de psicanalistas (e sociólogos, filósofos) falando sobre o maior problema enfrentado dos tempos atuais: a falta de tempo... para pensar, refletir, sentir, sonhar, fazer nada, ou fazer o que realmente gostamos de fazer.

Uma das inúmeras conseqüências (além da depressão, dos estados depressivos, dos estados de expectativa ansiosa, das compulsões, síndromes do pânico etc), é o agravamento de certas sensações que trazemos conosco desde muito tempo, dentre elas, a necessidade de lutarmos por nossas vidas, de nos defendermos, de sermos alguém... para os outros e para nós mesmos. Imersos num mundo cada vez mais exigente (em todos os sentidos!), nos sentimos cada vez menos; porque estamos cada vez mais sozinhos!

Tal como no filme “Ensaio sobre a cegueira”, encontramo-nos absolutamente sós em nossas aflições, porque o nosso vizinho, amigo, pai, mãe, marido, amiga, filho etc, etc, também está tentando sobreviver e, por isso, não pode nos oferecer a oportunidade de nos escutar, de se escutar. Não temos mais, portanto, sequer a chance de nos queixarmos! Para quem? E de que adiantaria isso?

A velocidade com a qual temos sido levados nos retira, em primeiríssimo lugar, a consciência de termos um corpo capaz de sentir e, não apenas, de obedecer aos inúmeros apelos, acumulativos, de “faça isso”, “faça aquilo”, “seja assim”, “seja assado”...

Não há mais ninguém para acolher nossas dores... Não há mais ninguém capaz de nos transmitir o mínimo de esperança no sentido mais íntimo, e mais simples, dessa palavra: ter esperança é ser capaz de usufruir de nossa capacidade de esperar.

Como esperar, se o “com-corrente” não pára de correr? Como esperar se o “Sistema” nunca sai do ar e, quando sai, eu não consigo dizer “Ai, que bom! Pausa!” – pelo contrário, nos desesperamos (perdemos a esperança!) numa fração de segundos!

E assim vivemos, se é que se pode chamar o que temos hoje de vida... Sem ninguém para quem nos queixarmos, sem ninguém que nos possa ouvir, sem que possamos, enfim, dizer para nós mesmos: “vai passar...”.

A esperança é um dos organizadores de nosso funcionamento psíquico e emocional.

EP

5 comentários:

  1. Eu estou naquela fase em que o tempo está de sobra e, por consequência, o ócio também. A depressão vem do mesmo jeito e a esperança fica indo e vindo. Portanto, não acho que é a agitação dos tempos que nos desesperança. Não está fora da gente. Quem tem esperança pela vida tem em tempos de muito e de pouco. Um abraço

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  2. Olá, "Vanvolf". Concordo com vc que "está dentro da gente". Mas onde é que a gente vai colocar isso que está dentro da gente, sem um espaço/tempo que nos possa acolher, para que o movimento nao pare? Libido precisa de tempo, e a falta de tempo (do mundo, das pessoas) acentua nossa solidao primordial. Sem tempo disponivel para sentir, para "estar com", o outro se transforma numa estátua, o mundo se congela... e nossa libido (que é nosso vinho, que é feita para circular!!!), acaba virando vinagre! Tudo está realmente dentro... Mas esse dentro só é capaz de se mostrar, de criar vida, na relaçao com o mundo. Nao somos absolutamente independentes!! E o mundo atual nos faz acreditar nesse tipo de ilusao - que é uma ilusao que nao nos ilude; ela nos deprime... Bjs e obrigada por fazer um comentário como o que vc fez!! Mostrou que vc leu!! Valeu!! EP

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  3. Pois é EP... Falava de mim sem perceber que o meu tempo em excesso e sem serventia vinha também da falta do tempo do outro. Obrigada. Acho que estamos inaugurando um novo espaço terapêutico - PSICANÁLISE BLOGUIANA rsrs. Um forte abraço. Vânia

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  4. Gisele10.9.09

    EP,
    Quando li seu texto e me deparei com o seu "com corrente", pensei logo no outro sentido (o "do bem"), o sentido de com correntes, com laços, com elos em comum e acho que é disso que vc está falando...
    Vania, adorei isso do espaço-terapeutico-psicanalítico-blogueano...rsrs
    Bjs
    Gisele

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  5. Vania, muito legal ver uma pessoa criando um nome e um espaço, a partir de suas proprias sacaçoes. Isso prova mais uma vez que o ser humano é, sim, capaz de se escutar, de dar a volta por cima e, entao, criar!!! O nome que vc deu para a sua criaçao é fantástico!!! Muito obrigada pelo presente!!

    Gi, adorei o "com corrente"!!Uma sacaçao e tanta!! Eu nem me dei conta disso quando escrevia mas vc (e a Vania), que leram, criando, enriqueceram o texto que saiu de algum lugar daqui... Este é o principio da terapeutica (bloguiana ou nao! rs...rs).

    Muitas beijocas para as duas!

    EP

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